quarta-feira, 20 de abril de 2011

Tem coisa mais destrutiva que insistir sem fé nenhuma?

"(...)Claro que você não tem culpa, coração, caímos exatamente na mesma ratoeira, a única diferença é que você pensa que pode escapar, e eu quero chafurdar na dor deste ferro enfiado fundo na minha garganta seca que só umedece com vodka, me passa o cigarro, não, não estou desesperada, não mais do que sempre estive, nothing special, baby, não estou louca nem bêbada, estou é lúcida pra caralho e sei claramente que não tenho nenhuma saída, ah não se preocupe, meu bem, depois que você sair tomo banho frio, leite quente com mel de eucalipto, gin-seng e lexotan,depois deito, depois durmo, depois acordo e passo uma semana a ban-chá e arroz integral, absolutamente santa, absolutamente pura, absolutamente limpa, depois tomo outro porre, cheiro cinco gramas, bato o carro numa esquina ou ligo para o CVV às quatro da madrugada e alugo a cabeça dum panaca qualquer choramingando coisas do tipo preciso-tanto-de-uma-razão-para-viver-e-sei-que-esta-razão-só-está-dentro-de-mim-bababá-bababá, até o sol pintar atrás daqueles edifícios, não vou tomar nenhuma medida drástica, a não ser continuar, tem coisa mais destrutiva que insistir sem fé nenhuma?”

(Caio Fernando Abreu, Fragmentos)

2 comentários:

fatimawines disse...

Olá,

Que bem que liga este texto com o copo de cólera!
Não conheço em profundidade esse Caio F.Abreu, em fragmentos e outras obras, mas, pela amostra promete.
"Pai afasta de mim esse cálice, de vinho tinto de sangue!"
A vida ensina-nos, a fé alumia os nossos caminhos.
Uma doce Páscoa, sem "porre", mas tomando um vinho dos bons.

Freud explica disse...

A verdade soa bela em qualquer situação. são belas palavras.