domingo, 4 de novembro de 2012

Da morte que faz viver


Ainda estou viva, mas já morri muitas vezes. Morro a cada vez que o amor morre, e, por mais que eu lute, ele está sempre morrendo dentro de mim. A cada morte, o mesmo ritual: o enterro bem no fundo do peito, e começo a construir muros e torres com palavras ao redor do coração para que ele não volte. Mas ele sempre volta. Por mais que eu pense, por mais que eu fale, por mais que eu articule. Por mais que eu envelheça, inteligente e culta, acreditando-me superior à ingenuidade do amor, ele sempre volta.
Há vezes em que volta destruindo tudo, uma avalanche de palavras outras, do outro, que se enfiam no meio das minhas e arrancam sangue com cada letra separada. Em outros momentos, o amor chega como uma brisa silenciosa e persistente, infiltrando-se nos pequeninos espaços entre uma letra e outra, e quando dou por mim ele embaralhou-as todas, e já não sei mais o que estou dizendo. Porque é essa a maior arma do amor: ele me faz renascer em novas palavras inventadas a dois, palavras doces, palavras vorazes, palavras belas, ou até mesmo palavras cruéis, não importa. Podem até ser palavras feitas de silêncios, desenhos ou números. Sua força não está no conteúdo, mas no modo como, ao escrevê-las, elas se inscrevem em mim.
Quando sinto aquelas novas palavras tatuadas na pele e na alma, já sei: estou prestes a morrer mais uma vez.

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